Compliance: Sua importância no setor da saúde
Debora monteiro Alves
Lucas Haddad de Oliveira Haase
Advogado Corporativo do Hospital Sepaco
O termo “Compliance” ganhou notoriedade especialmente no transcurso da Operação Lava Jato, deflagrada pela Polícia Federal em março de 2014, que trouxe à tona diversas situações de fraudes e desvios tanto no setor público, quanto no setor privado.
O aludido termo possui origem na expressão do inglês “to comply with”, cuja tradução para o português é “estar em conformidade”. Tal expressão possui relevante importância na compreensão do termo, já que, na prática, Compliance é o conjunto de procedimentos e normas, legais e internas (definidas pela instituição), em total consonância com a ética e a transparência corporativa.
No Brasil, devido ao grande número de legislações e normas que hoje vigoram, é imprescindível que as empresas, de todos os portes e segmentos, compreendam e organizem seu Compliance de modo a se manterem em consonância com os procedimentos e as normas definidas em lei e, dessa forma, afastam riscos desnecessários que possam trazer prejuízos financeiros, legais e reputacionais. Em que pese a quantidade de legislações sobre o assunto, destacam-se as seguintes leis, consideradas marcos do Compliance no Brasil:
Figura 1: Principais leis que compõem o Compliance
Desses marcos, a Lei Anticorrupção, de agosto de 2013, possui uma relevância ainda maior,
pois, a partir dela, as empresas passaram a ser ativamente fiscalizadas e cobradas, inclusive de forma indireta, respondendo objetivamente por eventuais atos de seus prepostos.
Com isso, tornou-se necessário que as organizações adotassem ainda mais medidas para fiscalizar sua conduta interna e externa, a fim de que pudessem garantir sua conformidade com as leis e dentro de diretrizes éticas. Entre as medidas empregadas, está o surgimento do programa de Compliance, sendo este um importante instrumento que demonstrava o interes-se corporativo na manutenção e na disseminação das boas práticas para todos os seus prepostos.
É importante ressaltar que a prática do Compliance não se dá apenas sob a perspectiva do cumprimento de exigências legislativas, já que seu principal objetivo é o de agregar valores de excelência e segurança operacional, o que nem sempre é exigido por normas legais. Daí a necessidade de que o Compliance de uma instituição possua normas internas que não apenas estejam em congruência com a lei, mas que também definam regras que possibilitem o cumprimento de seus objetivos principais.
Pelo fato de trazer maior segurança financeira, legal e reputacional a uma instituição, as empresas que não desenvolvem ou não contam com um projeto de Compliance estruturado estão sujeitas a perder clientes e negócios importantes, pois sua adoção deixou de ser uma tendência de mercado, tornando-se requisito para comprovação da seriedade e da hones-tidade da instituição na condução de seus negócios.
Visando ao mesmo objetivo, a Governança trabalha na definição de todos os processos, cultura, regulamentação e práticas profissionais dentro de uma instituição. São, portanto, conceitos que se complementam, já que as políticas de Compliance de uma instituição visam garantir que todas as suas ações sejam realizadas dentro das normas, com respeito à ética e à verdade definidas pela Governança. Isso quer dizer que os dois conceitos devem caminhar juntos para garantir a integridade e a boa reputação da Instituição.
A política de Compliance, sempre em observação à ética e aos valores definidos pela Gover-nança, deve disseminar as melhores práticas, segundo suas regras, por todos os níveis da Instituição, orientando sobre o que é admitido, ou não, seja do ponto de vista moral, seja do ponto de vista legal. Ora, para o fim de que tais regras possam ser amplamente difundidas e aplicadas, é importantíssimo que haja, em todos os níveis da instituição, uma boa cultura organizacional. Quando há a prática de uma má conduta profissional, sendo esta de conhecimento geral, sem que haja, da instituição, qualquer tipo de orientação a quem a violou, ou ainda a devida punição à aludida má conduta, outros se sentirão à vontade
para agir da mesma forma, gerando-se nessa instituição a sensação de que não há a necessidade de cumprimento da regra não observada. Por outro lado, se a Instituição condena esse tipo de atitude e, por exemplo, oferece canais para que seus profissionais possam denunciar essas práticas de forma anônima, as medidas dessa instituição inibirão o comportamento desaprovado.
Portanto, a formação de uma boa cultura organizacional se dá com a implementação de medidas que inibam más práticas e incentivam a observação de suas normas. Há, portanto, um profundo interesse na promoção de uma cultura amparada na ética por parte dos ges-tores da instituição, a fim de que sua política de Compliance não seja apenas teórica, mas seja devidamente aplicada, guiando a forma de agir de todos os seus destinatários.
O Compliance no setor da saúde
A implementação de boas práticas por meio da governança e de uma política de Compliance no setor da saúde não deve estar atrelada apenas à ideia de evitar perdas financeiras. Muito além, o cumprimento da Lei e das normas internas da organização deve se dar para o fim de se evitar que incorra em riscos de inconformidade, que vão desde o descarte irregular de resíduos infectantes, até a falta de transparência na cobrança de contas hospitalares.
Verifica-se, dessa forma, o quão fundamental é o Compliance quando a intenção é a de que a instituição possua credibilidade frente à sociedade. A prática garante uma cultura organizacio-nal, que, por sua vez, garante a aderência na conformidade com leis e regulamentos, de modo a contribuir por transparência na gestão, nas relações e, com isso, trazendo mais qualidade e segurança aos pacientes.
Um exemplo de aplicação do acima mencionado são as situações, bastante difundidas, nos mais diversos veículos midiáticos, de fraudes com Órteses, Próteses e Materiais Especiais (OPMEs). Como tentativa de combate a tais situações de fraude, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) publicou a Resolução Normativa nº443 de janeiro de 2019, posterior-mente revogada pela Resolução Normativa nº 518 de abril de 2022, que estabelece práticas de governança corporativa e gestão de riscos, além de incentivar a criação do programa de Compliance, dando uma diretriz, portanto, para a implementação de controles internos pelas Operadoras de Saúde.
Pode-se verificar que o principal objetivo da aludida norma é o de modificar uma cultura, de forma a fundamentar tal busca na tríade governança, riscos e Compliance, com transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa.
Percebe-se que a publicação da Resolução Normativa outrora mencionada é um marco para que as próprias Operadoras de Saúde atuem de forma proativa, de modo a minar, ou ao menos dificultar, eventuais condutas avessas à sua política de Compliance, com a exigência de idoneidade e transparência de todas as partes envolvidas.
O Sepaco e seu Programa de Compliance
Buscando atualização constante, baseado nas etapas fundamentais da implementação de um programa de Compliance, o Sepaco tem buscado sua construção e solidificação, podendo ser observados grandes avanços em sua implementação. Um passo importante rumo a esse objetivo foi a facilitação do processo de denúncias, com a criação de um canal em que são garantidos o anonimato e a confidencialidade, mediante formulários online, de modo a não haver exposição daqueles que tenham o interesse de denunciar práticas que estejam
em desacordo com sua política de Compliance.
Referências bibliográficas
• Andrade A, Rossetti JP. Governança corporativa: fundamentos, desenvolvimento e tendências. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
• Carlini A, Saavedra GA (Coord.). Compliance na área da Saúde. Indaiatuba: Foco; 2020.
• COMPLIANCE NO SETOR DE SAÚDE: ENTENDA A IMPORTÂNCIA E COMO FAZER. Disponível em: Redação LEC. https://lec.com.br/compliance-no-setor-de-saude-entenda-a-importancia-e-como-fazer/. Acesso em: 14 jul. 2022).