Relato de Experiência: manejo de recém-nascidos filhos de mães com suspeita ou diagnóstico de COVID-19

Tempo de leitura: 33 minutos

Bárbara Alencar Novaes
Médica diarista da UTI Neonatal

Lúcio Flávio Peixoto Lima
Coordenador da UTI Neonatal e Pediátrica

Renata de Paula Gomes Nunes de Castro
Coordenadora assistencial da UTI Neonatal


Resumo
Objetivo: revisar as diretrizes e protocolos de atendimento e cuidados aos recém-nascidos filhos de mães suspeitas ou confirmadas de COVID-19 publicados até o momento, somando-se a isso a experiência de nossa unidade. Método: Trata-se de um estudo descritivo, tipo relato de experiência, realizado na UTI Neonatal do Hospital Sepaco. Resultados: Os recém-nascidos são uma população vulnerável, principalmente prematuros, e é necessário o planejamento adequado para o atendimento desses pacientes, seja no alojamento conjunto ou na Unidade Neonatal. Desde o primeiro caso neonatal de COVID-19 relatado em fevereiro de 2020, aumentou-se a preocupação sobre a possível transmissão vertical. Os primeiros relatórios chineses sugeriram que a ela não ocorre, porém houve um relato de caso de um RN com teste positivo precoce sugestivo de transmissão vertical intra-útero. A decisão pela via de parto deve ser tomada em conjunto entre a equipe médica e a família. Idealmente, o parto deve ocorrer em sala com isolamento por pressão negativa, com equipamentos de proteção individual adequados. Conclusão: O número de pacientes infectados pelo novo coronavírus cresce vertiginosamente. A pandemia pelo COVID-19 já afetou cerca de vinte e sete milhões de pessoas no mundo, causando mais de oitocentas e noventa mil mortes. Apesar da doença afetar todas as idades, os dados disponíveis sobre gestantes e recém-nascidos (RN) com COVID-19 ainda são limitados. Relatos de casos do primeiro epicentro da epidemia, a China, sugerem que o efeito do SARS-CoV-2 em mulheres grávidas seja semelhante ao de adultos da mesma faixa etária. Ruptura prematura de membranas, parto prematuro, taquicardia fetal e sofrimento fetal são as principais complicações associadas ao COVID-19 no terceiro trimestre. Os casos pediátricos de COVID-19 foram, até agora, relatados como menos graves do que a doença que ocorre em adultos e idosos. 


Introdução
A pandemia pelo novo coronavírus se espalhou rapidamente por todos os continentes, tornando-se uma emergência de saúde mundial.  O número de infectados pelo SARS-CoV-2 cresce vertiginosamente. A infecção pode apresentar sintomas diversos, tosse, febre, dor de cabeça, alterações de paladar e olfato, diarreia e vômitos. A COVID-19 já afetou cerca de vinte e sete milhões de pessoas no mundo, causando mais de oitocentas e noventa mil mortes (1).

A COVID-19 afeta todas as idades, porém idosos e adultos com determinadas comorbidades parecem ter mais riscos de desenvolverem formas graves da doença. Já os dados disponíveis sobre gestantes e recém-nascidos infectados ainda são limitados. A gestação, com suas particularidades, altera a resposta imunológica, levando a uma maior suscetibilidade de gestantes a infecções virais. Potencialmente, algumas delas podem ser transmitidas ao feto durante a gestação e causar efeitos adversos graves.  Entretanto, são escassas as evidências científicas sobre o comportamento do SARS-CoV-2 nesse contexto. Relatos de casos do primeiro epicentro da epidemia, a China, sugerem que seu efeito em mulheres grávidas é semelhante ao de adultos da mesma faixa etária. Não há evidência de maior gravidade clínica durante a gravidez, nem de uma maior prevalência de complicações obstétricas (2).

Não existem dados sobre o efeito do SARS-CoV-2 no primeiro trimestre da gravidez. Ruptura prematura de membranas ovulares, parto prematuro, taquicardia fetal e sofrimento fetal são as principais complicações associadas à COVID-19 no terceiro trimestre. Quase metade das gestantes (47%) infectadas tiveram parto prematuro.  Em gestantes com doença grave, o parto prematuro ocorreu principalmente por indicação de causa materna. O aborto espontâneo também foi relatado duas vezes no início da gravidez e morte fetal foi relatada 5 vezes. Foram descritas anormalidades significativas nas placentas de mulheres com COVID-19, como má perfusão vascular materna e fetal, trombos nos vasos fetais, infartos multifocais e coriohemangioma, mesmo em pacientes assintomáticas (3).

Desde o primeiro caso neonatal de COVID-19 relatado em fevereiro de 2020, aumentou-se a preocupação sobre a possível transmissão vertical. Os primeiros relatórios chineses sugeriram que a transmissão vertical de SARS-CoV-2 não ocorre, pois o líquido amniótico, muco-vaginal, placenta, cordão umbilical, sangue do cordão umbilical e amostras de fezes neonatais apresentaram resultados negativos para a pesquisa do vírus. Swabs nasofaríngeos coletados desses recém-nascidos imediatamente após ao parto foram negativos, porém há um relato de caso de um recém-nascido com teste positivo precoce sugestivo de transmissão vertical intra-útero, com elevação de anticorpos SARS-CoV-2 IgM e IgG em amostras coletadas duas horas após o nascimento, sugerindo, mas não comprovando, exposição fetal ao vírus intra-útero (4,8).  

A decisão pela via de parto deve ser tomada em conjunto entre a equipe médica e a família, de acordo com as indicações obstétricas. No entanto, a maioria das gestantes com COVID-19 tiveram parto cesárea na China. Idealmente, o parto deve ocorrer em sala com isolamento por pressão negativa, com todos equipamentos de proteção individual para as equipes envolvidas. O clampeamento tardio de cordão não é recomendado (5).

Os casos pediátricos de COVID-19 foram, até agora, relatados como menos graves do que a doença que ocorre em adultos e idosos. Os recém-nascidos são uma população extremamente vulnerável, principalmente os prematuros, e é necessário preparação e planejamento para o atendimento desses pacientes suscetíveis à infecção pelo novo coronavírus na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal, com objetivo de cuidar e proteger bebês, suas famílias e os profissionais de saúde. Alguns relatos de caso descrevem recém-nascidos com sintomas que exigiram admissão na UTI Neonatal por aumento do trabalho respiratório, taquicardia, febre, sintomas gastrointestinais e sinais de infecção pulmonar na tomografia computadorizada. Dentre 5 bebês avaliados por Golden et al (3), 2 tinham swabs nasofaríngeos positivos para SARS-CoV-2. Inesperadamente, alguns bebês sintomáticos tiveram resultados negativos. Há um relato de caso de SARS-CoV-2 positivo em dois neonatos, assintomáticos, porém com dificuldade inicial para introdução de dieta (9).

O objetivo desse artigo foi revisar as diretrizes e protocolos de atendimento e cuidados aos recémnascidos filhos de mães suspeitas ou confirmadas de COVID-19 publicados até o momento, somando-se a isso a experiência de nossa unidade.

Método
Foi realizada revisão da literatura médica recente sobre manejo de neonatos filhos de mães com COVID-19 suspeita ou confirmada, focando no atendimento em UTI neonatal. A pesquisa foi realizada na PubMed e as palavras-chave utilizadas foram: recém-nascido, COVID-19, SARS-CoV-19, gestação, amamentação, leite materno. Também foi descrita nossa experiência nos meses de maio e junho de 2020.

Discussão
Uma revisão recente de 72.314 casos pelo Centro Chinês de Controle e Prevenção de Doenças mostrou que menos de 1% dos casos ocorreram em crianças menores de 10 anos de idade (6). As crianças são menos suscetíveis a formas graves de infecção (obs.: a suscetibilidade pode ser semelhante) por SARS-CoV-2, apresentando geralmente formas leves da doença (10).

O consenso chinês define como suspeito um recémnascido de mãe com COVID-19 que foi comprovada entre 14 dias antes e 28 dias após o parto, ou se diretamente exposto à infecção após o nascimento. Já as diretrizes da Academia Americana de Pediatria (AAP) consideram todo neonato nascido de uma mulher com suspeita ou confirmada de COVID-19 como paciente sob investigação (11).

O modo de transmissão para COVID-19 é conhecido por ser através da exposição a gotículas respiratórias e fômites. A transmissão pessoa a pessoa ocorre durante a exposição próxima a um indivíduo infectado ou por contato com superfícies contaminadas com secreções contendo vírus viável. O papel das pequenas partículas respiráveis ​​(aerossóis ou núcleos de gotículas) para a transmissão ainda não está claro. A eliminação viral foi observada em amostras de fezes de pacientes infectados, no entanto, não é certo se a transmissão fecal-oral ocorra (12).

Os RNs filhos de mães positivas para SARS-CoV-2 são, em sua maioria, assintomáticos. No entanto, a doença neonatal ainda é uma possibilidade. Dessa forma, os cuidados de isolamento e a transmissão vertical devem ser estudados exaustivamente. Além disso, é necessário testar esses recém-nascidos por meio de cotonete nasofaríngeo após o nascimento e monitorá-los quanto ao desenvolvimento de sintomas. Os sintomas neonatais descritos foram, principalmente, desconforto respiratório, quedas de saturação de oxigênio e dificuldades de alimentação (13). Atualmente, o exame RT-PCR é considerado o padrão-ouro para o diagnóstico (14).

Cuidados na sala de parto
A preparação para o parto e recepção do RN, filho de mãe com COVID-19 suspeita ou confirmada, deve ser realizada de forma protocolada, assim como sua admissão na unidade de terapia intensiva neonatal. Todas as gestantes com sintomas gripais ou respiratórios, incluindo febre isolada, devem ser testadas. A comunicação entre as equipes de saúde deve ser clara e efetiva, para que os profissionais possam se preparar adequadamente para o atendimento do binômio mãe-bebê.

São considerados procedimentos de alto risco de exposição para o profissional de saúde intubação orotraqueal, extubação, aspiração aberta das vias aéreas, nebulização, ressuscitação cardiopulmonar, pressão positiva contínua nas vias aéreas, ventilação com equipamento bolsa – valva – máscara e broncoscopia. Os pais devem ser informados sobre as medidas de precaução e sobre os riscos de transmissão para o recém-nascido, e o desejo de amamentar também deve ser questionado. Nesse momento, é necessário que o diálogo seja claro e que as dúvidas sejam sanadas na medida do possível.

Deve-se preparar uma sala com isolamento por pressão negativa quando possível, principalmente para as pacientes que possam necessitar de procedimentos geradores de aerossol, além de garantir material de proteção pessoal para os profissionais de saúde envolvidos. As mães com infecção suspeita ou confirmada, com quadro clínico estável, podem, alternativamente, ficar em uma sala de pressão neutra com precauções de gotículas / contato / proteção ocular (máscara cirúrgica N95 ou respiratório superior preferencial) / proteção ocular / avental / luvas). Recomenda-se definir times de atendimento para pacientes de baixo e de alto risco, com membros de equipe de apoio fora da sala para fornecer cobertura se ajuda for necessária na reanimação neonatal.

Em casos de alto risco, com possível necessidade de intubação orotraqueal ou reanimação avançada, o pediatra mais experiente deve ser escalado, minimizando riscos de exposição e contaminação. Um bebê nascido de uma mãe com síndrome respiratória aguda grave por COVID-19, sob ventilação invasiva e anestesia geral pode estar deprimido e precisar de reanimação como consequência de doença respiratória materna ou anestesia (14). O reanimador manual montado para suporte ventilatório do RN deve conter o filtro HEPA, para minimizar os aerossóis produzidos durante a ventilação com pressão positiva (12).

Alocação do RN após o nascimento
Após o nascimento, as orientações para o manejo do RN também são discrepantes. De acordo com os autores chineses, imediatamente após o nascimento, o RN deve ser separado da mãe independentemente da presença de sintomas neonatais e do resultado da pesquisa neonatal SARS-CoV-2 por reação em cadeia da transcrição reversa da polimerase. O neonato deve ser internado em uma enfermaria de quarentena e submetido a exames laboratoriais completos, diagnóstico radiológico e monitoramento das funções vitais.

Já de acordo com as diretrizes da AAP, o manejo do RN deve ser baseado em suas condições clínicas, sendo encaminhado à UTI neonatal apenas se necessário. Ao contrário das diretrizes chinesas, a AAP não descarta a possibilidade de alojamento conjunto da mãe e bebê (11). O banho precoce para minimizar a exposição pode ser considerado em recém-nascidos a termoestáveis, ​​nascidos de mães com suspeita ou confirmação de COVID-19 (14). As diretrizes do Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) não fornecem uma recomendação específica, mas sugerem que a separação da mãe e bebê ou alojamento conjunto sejam avaliados e decididos caso a caso, compartilhando a tomada de decisão entre a mãe, pai e a equipe clínica, avaliando cuidadosamente algumas variáveis: condições clínicas da mãe e do bebê; os resultados do teste SARSCoV-2 da mãe e do bebê (um resultado positivo infantil excluiria a necessidade de separação se o RN estiver clinicamente estável); decisão sobre amamentação; a logística do ambiente; a capacidade de manter a separação após a alta.

Outras diretrizes (Sociedade Francesa de Neonatologia, Sociedade Italiana de Neonatologia, Royal College for Pediatric and Child Health, Canadian Pediatric Society e WHO) sugerem que o RN pode permanecer com o mãe com suspeita ou confirmação de SARS-CoV-2 no alojamento conjunto. A decisão de separar ou não depende das condições clínicas maternas e / ou do RN na maioria das diretrizes. Nenhuma dessas recomendações leva em consideração os resultados isolados do teste SARS-CoV-2 da mãe e do neonato para a decisão de alojamento conjunto ou separação (11).

Um estudo recente relatou que a infecção neonatal por COVID-19 é incomum, frequentemente assintomática e a taxa de infecção não é maior quando o bebê nasce de parto normal, é amamentado ou permite-se o contato com a mãe (15).

A recomendação atual é que o bebê faça o teste no dia 1 (de preferência antes de qualquer contato direto com a mãe) e, se positivo, o teste pode ser repetido nos dias 3-5. Caso ainda seja positivo, deverá ser programado novo exame. Se o exame inicial for negativo, pode se considerar um novo teste após 48h.

Se o bebê e a mãe estiverem bem e o bebê for negativo, o bebê pode ter alta para casa. Se o bebê for positivo para COVID-19, devido ao curso imprevisível, deve-se considerar o monitoramento em hospital até que um resultado negativo seja documentado. À medida que a condição evolui e mais casos são relatados, o teste em bebês assintomáticos pode não ser necessário – deve ser viável gerenciar bebês COVID-19 positivos assintomáticos em casa também após um período de estabilidade inicial e exames repetidos de rotina podem não ser necessários, desde que sejam isolados e devidamente monitorados.

Caso o bebê seja positivo e sintomático, é sugerida a admissão em UTI neonatal, acomodação em incubadora, isolamento conforme protocolo, suporte ventilatório de acordo com o quadro clínico, já que alguns casos podem se manifestar como uma bronquiolite viral, avaliação de necessidade de introdução de antibióticos e garantia de suporte nutricional, caso haja intolerância alimentar (10).

Amamentação
Quanto à amamentação, a orientação inicial das principais autoridades médicas foi a suspensão temporária do aleitamento materno, ou, ao menos, a alimentação do RN com o leite materno ordenhado e não a amamentação durante o período de maior infectividade da mãe, como no caso da AAP. O racional para esse tipo de recomendação foi o desconhecimento sobre o risco da infecção pelo SARS-Cov-2 no período neonatal imediato, além do conhecimento prévio sobre a imaturidade imunológica do RN e o risco de maior morbimortalidade em caso de infecções virais ou bacterianas (2,16).

Os relatos iniciais não identificaram o vírus no leite materno, entretanto alguns relatos posteriores, da China e Alemanha, documentaram a presença de RNA viral por método de PCR (18,19). Importante salientar que, como não foi realizada a cultura viral, não foi possível determinar a presença do vírus com potencial de infecção. Além disso, em alguns relatos as mulheres não utilizaram máscara durante a coleta de leite, havendo a possibilidade de contaminação por secreções respiratórias.

A despeito da COVID-19, os benefícios nutricionais, imunológicos e biopsicossociais do aleitamento materno são amplamente conhecidos pelos profissionais envolvidos no cuidado materno infantil. Seja na redução das infecções, na redução da obesidade infantil ou na formação do vínculo mãe-bebê, além de outros benefícios. Também ocorre a passagem direta de anticorpos e outros fatores com ação no combate às infecções (2). São poucas as condições que levam à recomendação da suspensão do aleitamento, como a infecção pelo HIV. Nutrizes com infecções que necessitem de precauções respiratórias, como tuberculose ou varicela, podem oferecer o seu leite materno ordenhado, reduzindo a exposição do bebê (20).

No momento atual, apesar dos poucos dados científicos, sugere-se que a principal via de contaminação dos bebês seja por gotículas expelidas pelos cuidadores doentes e, de modo secundário, pelo contato com material biológico contaminado (5). Em revisão de literatura, Martins-Filho et al. (20) levantou 8 estudos que avaliaram a presença do RNA do SARS-CoV-2 no leite materno de gestantes que tiveram COVID-19 no terceiro trimestre da gestação, não sendo identificadas amostras positivas. Já em seu trabalho, a despeito da pequena amostra, Dong et al. (19) determinaram a presença de anticorpos do tipo IgA e IgG contra o SARS-CoV-2 no leite materno através da técnica de ELISA, evidenciando um potencial efeito protetor para os bebês amamentados.

Com o decorrer do tempo, órgãos internacionais, como a OMS e o CDC Americano, e nacionais, como o Ministério da Saúde e a Sociedade Brasileira de Pediatria, reavaliaram os riscos de transmissão do SARS-CoV-2 no contexto da amamentação e apresentaram parecer favorável ao aleitamento materno, desde que respeitadas as precauções necessárias e conforme o desejo da lactante e suas condições clínicas. Ainda conforme essas recomendações, orienta-se a não realizar o contato pele-a-pele e a amamentação na primeira hora de vida, ainda em sala de parto. O alojamento conjunto do binômio mãe/RN pode ser mantido, desde que haja uma distância de 2 metros entre a cama da mãe e o berço do bebê, além de todas as medidas de cuidado durante a amamentação. Tais medidas visam evitar a transmissão do vírus da mãe para o bebê através de gotículas respiratórias durante a amamentação (22,27).

Sempre que houver contato mãe x bebê devem ser observadas as seguintes medidas (2,21):
• Realizar a higiene das mãos por um período de, no mínimo, 20 segundos;
• Utilizar máscara que cubra nariz e boca, evitando falar durante a amamentação;
• Realizar a troca da máscara em caso de tosse x espirro;
• Caso a mulher deseje que o leite materno ordenhado seja oferecido por um cuidador saudável, além das medidas acima, deve-se realizar a higiene do material de bombeamento após cada ordenha.
Caso a lactante opte por suspender a amamentação, seja para manter a oferta do leite materno ordenhado ou por substituir temporariamente por fórmula láctea, é essencial que receba informações sobre a frequência e regularidade com que deve realizar a extração do leite, para manter a produção láctea até que se encerre o período de isolamento.

Mudanças na rotina na UTI Neonatal
Diante da possibilidade de admissão de RNs potencialmente contaminados com o SARS-CoV-2 na UTI Neonatal, as equipes multidisciplinares depararamse com a necessidade de mudanças em seus protocolos e rotinas, visando o atendimento seguro a tais bebês. Dentre as medidas, o uso constante e obrigatório de máscaras cirúrgicas e treinamentos de higiene das mãos foram atualizados nas unidades de terapia intensiva neonatal ao redor do mundo.

Reuniões clínicas, aulas e eventos científicos presenciais foram suspensos, susbtituídos por teleconferências e reuniões on-line. Os pais de RN internados foram questionados sobre sintomas gripais e/ou contato com pessoas infectadas. Se sintomáticos ou contactantes, encaminhados para coleta de swab nasofaríngeo e em caso positivo, eram afastados por 10 a 14 dias em média, retornando a frequentar a unidade apenas se assintomático e com exame controle negativo.

Nesse período de afastamento, como alternativa, as informações médicas sobre o paciente foram realizadas por videochamada ou chamada telefônica comum. Em alguns protocolos eram realizados testes de rotina semanais (swabs nasofaríngeos) em pais e profissionais de saúde atuantes na unidade de terapia intensiva neonatal, mesmo assintomáticos. Foi relatado restrição generalizada a visitas de pais para apenas algumas horas por dia, sendo um familiar por vez (27).

No Hospital Sepaco, desde o início da pandemia, foram realizados diversos partos de mães suspeitas e confirmadas com COVID-19. Nos casos em que as condições clínicas maternas e do RN permitiam, ambos permaneciam em alojamento conjunto, em isolamento conforme definido pela Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, sendo reforçadas as medidas de higiene materna antes de contato com o bebê e permitida a amamentação, caso a mãe assim desejasse.

Nos meses de maio e junho, foram encaminhamos à UTI neonatal 6 bebês, sendo 2 casos de mães com suspeita não confirmada de COVID-19 e 4 casos de mães COVID-19 confirmada. Foram realizados swabs nasofaríngeos em 5 RNs, todos negativos. Em 1 caso o exame não foi coletado porque a infecção materna foi descartada. Durante a internação, se a mãe em condições clínicas estáveis, a visita ao RN na UTI foi liberada seguindo o protocolo de precaução e higiene das mãos, durante 30 minutos, uma vez ao dia, durante a internação hospitalar materna.

Após a alta materna, caso o RN mantivesse necessidade de internação e a mãe ainda permanecesse sintomática e/ou durante o período de isolamento, a visita não foi permitida devido aos riscos de contaminação durante percurso, transporte e locomoção, por se tratar de uma questão de saúde pública. Dessa forma, as informações médicas foram transmitidas por meio de vídeochamada, com a visualização do RN no vídeo, sendo possível, além da garantia do boletim médico, a comunicação da mãe e pai com bebê por meio da voz, palavras de afeto e até músicas. Não tivemos nenhum caso de RN positivo na unidade de terapia intensiva neonatal do Hospital Sepaco.

Conclusão
Com o decorrer do tempo e o aumento do conhecimento sobre a transmissão e fisiopatologia do SARS-CoV-2, foi possível, com segurança, realizar mudanças nos protocolos de atenção ao binômio mãe/RN. Tais mudanças foram essenciais para a melhor possibilidade de vínculo mãe-bebê e favorecimento do aleitamento materno não apenas durante a internação, mas também futuro. A adoção de mudanças nos protocolos institucionais alinhada a diretrizes de procedimentos operacionais padrão garante a proteção dos pacientes, familiares e funcionários, bem como do vínculo familiar num contexto complexo.


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