Ética e sigilo no ambiente hospitalar
Dilma Suely Costa Borges
Assistente Social do Hospital Sepaco
Maria Helena Ruiz dos Reis
Assistente Social do Hospital Sepaco
Os hospitais são espaços em que as pessoas presentes estão em diferentes conjunturas econômicas, familiares, sanitárias e sociais. Esses contextos impactam diretamente na saúde tanto física quanto psicológica dos indivíduos. Nesse sentido, devemos considerar que os diversos aspectos da vida dos pacientes exigem a presença de profissionais multidisciplinares, com olhares direcionados no objetivo central de garantir o tratamento por completo, assegurando também nesse processo o direito de manter suas informações em segurança.
Cabe especificarmos que o dever de zelar pelo sigilo dos pacientes é uma questão ética e ao mesmo tempo legal, visto que a Constituição Brasileira de 1988 garante em seu título referente aos princípios fundamentais: Art. 5º, X: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de uma violação.”
O Código Penal Brasileiro caracteriza como crime a violação do segredo profissional, nos seguintes termos: Art. 154: “Revelar alguém, sem justa causa, segredo de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem. Pena – Detenção, de três meses a um ano, ou multa”.
Até mesmo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, entrevê guardar o sigilo em esfera internacional, no seu artigo XII: “Ninguém será sujeito à interferência em sua vida privada, sua família, seu lar ou sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Todo homem tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques”.
Toda legislação vigente em relação ao sigilo deixa claro que este é direito do paciente e dever dos profissionais, e os Códigos Deontológicos Multidisciplinares fazem menção às condutas que estes devem ter com os pacientes, a fim de assegurar seus direitos e acessos. Dessa maneira, o sigilo profissional deve estar atrelado à reflexão ética.
Todos os profissionais que tenham acesso aos prontuários dos pacientes são responsáveis em resguardar as informações ali contidas. As normatizações são contempladas nas seguintes resoluções do Conselho Federal de Medicina: Resolução CFM 1605/200; Resolução CFM 1638/2002; Resolução CFM 1821/2007; Resolução CFM 2218/2018; e no próprio Código de Ética Médica. A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) – Lei nº 13.709 vem para reforçar esse sigilo.
Intervenções
Em um trabalho eficaz, todos os profissionais envolvidos devem desenvolver um fluxo de atendimento, pois, dessa forma, conseguem identificar as principais demandas e as estratégias de intervenção relacionadas a elas. Essas estratégias devem estar de acordo com cada legislação, ou seja, supondo que uma das demandas seja em relação à negligência com o idoso. Então, trabalharemos com base no Estatuto do Idoso. Se a demanda for criança ou adolescente, trabalharemos em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Para essas intervenções, os profissionais devem realizar o atendimento, bem como a escuta qualificada. Já diante de suspeitas de maus-tratos a incapazes ou vulneráveis, abusos e casos em que o paciente representa risco de vida para si ou terceiros, mesmo que compulsoriamente, cabe a esses profissionais notificar os órgãos competentes. Ressalta-se que é necessário considerar nesse processo as particularidades do caso em questão, especialmente certificando-se de que legalmente essas são causas admissíveis a uma possível quebra no sigilo do paciente.
Considerações finais
Diante das questões expostas, fica claro que a articulação multiprofissional é fundamental para o tratamento, pois é através dessa interlocução que nossos pacientes são atendidos e que a ética é indispensável em todo esse processo.
Para Ceneviva, o dever ético cujo cumprimento é atribuído a uma pessoa em razão de sua profissão lhe imputa uma atitude de “obter apenas a informação necessária para o cumprimento da missão profissional, e não mais que isso”.
A instrumentalização do trabalho deve ser pautada nas legislações vigentes em relação à ética profissional e inobstante das adversidades que possam surgir durante a internação, com todos os envolvidos atuando para garantir o sigilo. Nesse sentido, independente da área de atuação, os profissionais devem ter ciência que seu trabalho na saúde tem início, meio e fim, sendo o encerramento na alta médica. Porém, o sigilo é ininterrupto, mesmo após a morte.
Referências bibliográficas
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