Golden Hour: É possível mudar o prognóstico de um bebê prematuro nos primeiros 60 minutos de vida?
Renata de Paula G. Nunes de Castro
Coordenadora Médica da UTI Neonatal do Hospital Sepaco
Golden hour, ou a Hora de Ouro, em Neonatologia, é um termo que se refere aos
primeiros 60 minutos após o nascimento deum bebê. O conceito foi implementado
na Neonatologia inspirado pelo manejo da primeira hora do trauma em adultos.
O primeiro atendimento ao recém-nascido (RN) tem impacto significante no seu desenvolvimento, principalmente quando se trata de bebês pré-termo, já que o
nascimento prematuro é um dos principais precursores de morte neonatal e
comorbidades potencialmente incapacitantes. O conceito abrange a reanimação
neonatal, cuidados pós-reanimação, transporte do RN e admissão em unidade
intensiva neonatal, com suporte ventilatório, cardiovascular, metabólico, nutricional
e infeccioso quando indicado.
O manejo perinatal e neonatal imediato na primeira hora de vida tem sido estudado
e revisado criteriosamente nos últimos anos, com o objetivo de melhorar e padronizar
o atendimento ao RN, capacitando os profissionais de saúde envolvidos, reduzindo,
além da mortalidade neonatal, sequelas e complicações como hipotermia, hemorragia
peri-intraventricular (HPIV), broncodisplasia, hipoglicemia e retinopatia da prematuridade.
Apesar dos avanços tecnológicos e científicos nos cuidados intensivos neonatais, a hemorragia peri-intraventricular continua com índices elevados mundialmente, com
sérias complicações neurológicas. Muitos estudos demonstraram que intervenções na
hora de ouro podem reduzir a incidência de HPIV e possíveis sequelas futuras.
Um dos pontos principais para o sucesso na Hora de Ouro é o manejo adequado
da temperatura corporal com prevenção da hipotermia, sendo considerada normotermia
a temperatura corporal entre 36,5 e 37,5 graus célsius. A hipotermia ainda afeta cerca
de 40% dos prematuros de muito baixo peso e está associada ao aumento de
mortalidade e morbidade. Para cada 1 grau abaixo da normalidade na temperatura
de admissão, a mortalidade aumenta 28%. Ela está relacionada também ao aumento
nas taxas de enterocolite necrotizante, condição de grave evolução para o recém-nascido, com alta morbimortalidade, e aumento nas taxas de HPIV.
Estratégias como temperatura da sala de parto acima de 23 graus, prevenção de
hipotermia materna antes do nascimento, uso de saco plástico e touca no RN, posicionamento sob fonte de calor radiante e campos aquecidos na recepção do
bebê, além do uso do colchão térmico quando indicado, são simples e podem
diminuir a hipotermia e melhorar a sobrevida neonatal.
Logo após o nascimento e o clampeamento do cordão umbilical, a glicemia
neonatal cai rapidamente. A manutenção da glicemia deve ser garantida com a
administração de glicose endovenosa na primeira hora de vida, preferencialmente
com infusão precoce de proteína, para evitar catabolismo e minimizar o risco
de hiperglicemia, estimulando a secreção endógena de insulina.
Não menos importante, o suporte ventilatório adequado com CPAP em sala de
parto reduz o número de intubações orotraqueais e ventilação mecânica invasiva,
a necessidade de administração de surfactante exógeno e o uso de corticoide
pós-natal.

UTI neonatal do Hospital Sepaco.
É necessário treinamento do time multidisciplinar para o uso correto do ventilador,
pois o sucesso depende também da técnica correta.
Após a estabilização inicial do RN, o transporte adequado para a unidade de terapia
intensiva neonatal é imprescindível na prevenção da hipotermia corporal e na
estabilidade ventilatória. Cuidados como temperatura da incubadora de transporte,
ventilação com gases aquecidos e com técnica apropriada, monitorização contínua, comunicação entre equipes de sala de parto e UTI, preparo de leito antecipado e
organização na admissão do RN são fatores determinantes para um bom prognóstico.
Já na unidade de terapia intensiva, a sincronicidade na equipe multidisciplinar
e a agilidade nas condutas garantem a continuidade do sucesso na Golden Hour.
A preparação para a admissão de um prematuro extremo é de suma importância,
com comunicação clara entre os profissionais, assegurando que as intervenções
sejam realizadas conforme o protocolo instituído.
Manejo de temperatura, suporte ventilatório adequado com CPAP em sala de
parto, infusão de glicose, aminoácidos e antibióticos se indicados na primeira
hora de vida, transporte seguro e otimização de comunicação entre equipes
envolvidas no atendimento mãe-RN são os passos principais que podem melhorar
o prognóstico dos nossos prematurinhos. Com organização, capacitação da
equipe, elaboração de protocolos, estrutura física adequada e empenho do time
multiprofissional, é possível garantir o melhor atendimento nos primeiros 60
minutos de vida do recém-nascido, reduzindo riscos de danos futuros e
melhorando o prognóstico neonatal.
Referências bibliográficas
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