Órteses: recurso terapêutico na adequação postural, prevenção de deformidades, auxílio no desenvolvimento neuropsicomotor e percepto-cognitivo do prematuro

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Adriano Conrado Rodrigues
Terapeuta Ocupacional da Triplicare Saúde no Hospital Sepaco

Muito se fala na humanização dos serviços de saúde e no impacto
positivo no que diz respeito à experiência do paciente durante um
processo de atenção, seja no contexto ambulatorial seja no hospitalar.

O que caracteriza um serviço de saúde como humanizado é a sua
capacidade de atender de modo eficiente às demandas da população
que referência, ou seja, prover acolhimento, escuta e sistemática resposta
aos processos de saúde-doença envolvidos, mantendo uma comunicação
eficaz, sob um olhar integral (biopsicossocial e espiritual).

Mais especificamente, quando abordamos o tema “prematuridade”,
nos voltamos para protocolos especiais de atenção humanizada e,
por vezes, da necessidade de acompanhamento do bebê recém-nascido
(RN) prematuro (pré-termo) em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal,
cujo objetivo principal é a manutenção da vida em todo o seu potencial.

O RN à termo é aquele cuja idade gestacional é de 37 a 42 semanas
e o RN pré-termo corresponde aos nascidos com menos de 37 semanas
de gestação.

Assim, temos as questões relacionadas ao processo de internação e diagnóstico
clínico e funcional – estrutura e função corporal, atividades e participação
propostas na rotina de internação e abordagem multiprofissional, além dos
fatores contextuais e pessoais, inclusive dos pais ou familiares presentes que
podem experienciar momentos de angústia, sofrimento ou ansiedade frente
à rotina de internação e condição em que o bebê se encontra.

Todos esses aspectos que circundam a prematuridade podem gerar atraso
ou impedir o desenvolvimento neuropsicomotor e perceptocognitivo do
RN, como já evidenciado em inúmeros artigos científicos disponíveis nas
principais bases de dados nacionais e internacionais.

Daí a importância da equipe multiprofissional, especializada que compõe
a Unidade de Terapia Intensiva, e particularmente da Terapia Ocupacional,
como profissão / profissional responsável (entre tantas coisas) pela avaliação
do desempenho ocupacional do ser humano nas diferentes fases da vida
e atividades de interação ou engajamento em sua rotina diária, que no caso
do RN prematuro se correlaciona com os aspectos de seu desenvolvimento.


É grande a incidência de alterações posturais em RN prematuros, quer seja
por malformação congênita, alterações neurológicas, postura intrauterina
ou longa permanência no leito de internação (figuras 1 e 3).

Um estudo de 2017 (1) mostra que, ao longo da década de 1990,
houve uma grande evolução na abordagem a alterações posturais
de RN prematuros com o emprego de Órteses (figuras 2 e 4) de
posicionamento já a partir da primeira semana de nascimento, o
que reduziu o número de cirurgias corretivas em relação aos anos
anteriores.


Esse estudo também mostra que RN prematuros que possuem
indicação para o uso de Órteses podem apresentar outros problemas
clínicos associados – congênitos ou adquiridos, o que pode ser
priorizado no plano terapêutico determinado pela equipe multiprofissional.

A Unidade de Terapia Intensiva Neonatal do Hospital Sepaco dispõe
de 30 leitos regulares. Um recorte de 12 meses onde foi analisada a
abordagem terapêutica ocupacional realizada mostra 136 RN pré-termo
avaliados, dos quais 95 RN (70%) tiveram indicação para uso de Órteses,
seja para adequação postural ou posicionamento dos membros superiores
(braços /mãos), seja para os membros inferiores (pernas/pés), as quais
mostraram-se efetivas aos objetivos propostos. Apresentam-se abaixo
dois casos (figuras 5 e 6) de posicionamentos para exemplificar o emprego
de Órteses como recurso terapêutico, na abordagem ao RN pré-termo:

Com a aferência das medidas anatômicas e ósteo-articulares do bebê (moldes
desenhados e goniometria), o Terapeuta Ocupacional pré-confecciona em
ambulatório a Órtese a ser empregada, seguindo para uma fase de prova do
posicionamento, e, se estiver adequada em relação ao objetivo proposto,
a Órtese é dispensada para uso em uma dinâmica individualizada que
considera o tempo de permanência, cuidados relacionados à clínica médica,
rotina de cuidados da equipe de Enfermagem (inclusive Estomaterapia),
Fisioterapia e demais profissionais da Equipe Multiprofissional, entre outras
intervenções associadas a segurança e bem-estar do RN.


Desde que haja a correta avaliação e discussão do caso em equipe,
não há restrição de idade para a indicação do uso de Órteses. Em
nosso serviço, as Órteses foram empregadas em RN a partir de 27
semanas de idade gestacional até termo, e, na maioria dos casos,
os critérios de elegibilidade estavam estão associados à estabilidade
ou ao equilíbrio hemodinâmico, bem como à necessidade de adequação
postural ou à prevenção de deformidades, além do estímulo para melhor
organização do comportamento motor (figura 7):

Vale lembrar que cada caso deve ser discutido individualmente, e o familiar
ou responsável pode ser orientado pelo Terapeuta sobre a manutenção do
uso das Órteses durante a rotina diária ao longo do período de internação.
Esta pode seguir mesmo após a alta, conforme evoluído em prontuário e
relatório de internação, e se houver conduta, poderá poderá seguir mesmo
após a alta do RN da UTI Neonatal.

Assim, a atenção terapêutica ocupacional com o recurso das Órteses nas
alterações posturais de RN prematuros em Unidade de Terapia Intensiva
têm um importante papel junto ao RN prematuro e reforça o ideal de
humanização em saúde no contexto hospitalar.

Referências bibliográficas
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Sobre o autor

  • Terapeuta Ocupacional da Triplicare Saúde no Hospital Sepaco. Mestre em Ciências da Reabilitação Neuromotora pela Universidade Bandeirantes de São Paulo - UNIBAN Especialização em Terapia da Mão pela Associação dos Terapeutas Ocupacionais do Estado do Rio de Janeiro - ATOERJ Graduado em Terapia Ocupacional, com equivalência oficial de bacharelado nos EUA pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas - PUCCAMP