Pandemia COVID-19: emergência global com atuação local

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Fernanda Regina de Campos Radziavicius
da Redação da Revista Scientia

Dra. Ariane Melaré Ramos dos Santos é infectologista no Hospital Sepaco e foi entrevistada para esta edição. Foto: Jonatas Oliveira

A pandemia de COVID-19 é uma emergência de saúde pública sem precedentes na história moderna. O cenário trouxe diversas incertezas e mudanças no cotidiano, tanto profissional como pessoal.

A situação alterou paradigmas e impactou positiva e negativamente nas rotinas do hospital e da equipe. O impacto negativo da pandemia, além das incertezas e do medo, bem como a alteração na rotina de trabalho. Muitas atividades rotineiras ao controle de infecção foram para segundo plano, pois a prioridade nesse momento passaram a ser as demandas relacionadas à COVID-19.

Se existe algo de positivo nesse cenário, talvez seja o fato da Infectologia e o Controle de Infecção alcançarem maior visibilidade dentro da instituição e na sociedade e temas que sempre foram abordados pela área, como a higiene das mãos, por exemplo, em 2020 receberam um grande destaque.

No Sepaco, o Serviço de Controle de Infecção Hospitalar (SCIH) foi responsável por diversas ações visando proteger colaboradores e manter a eficácia do atendimento diante do novo. Liderado pela Dra. Fátima Maria Venâncio Porfírio, o setor elaborou, entre outras coisas, sinalizações, treinamentos e participou ativamente das orientações aos colaboradores e pacientes.

Muitas questões relacionadas à COVID-19 ainda encontram-se sem respostas. No entanto, os efeitos da pandemia propiciaram a expansão e a aceleração das pesquisas em saúde, de modo que a ciência possa responder a todas elas o mais breve possível.

Hoje, em relação ao início da pandemia, aceleramos alguns processos mas ainda é necessário dar alguns passos importantes para que conheçamos a COVID-19 totalmente. Para elencar o que sabemos sobre a doença, conversamos com a Dra. Ariane Melaré Ramos dos Santos, infectologista do Hospital Sepaco. Ela faz um panorama geral sobre a doença, quais cuidados devem ser tomados para evitar a infecção pelo vírus e a propagação da doença e reforça: “Como ainda não dispomos de tratamento ou vacina efetiva até o momento, a melhor conduta é a prevenção”.

A equipe do SCIH do Hospital Sepaco: Em pé (da esquerda para a direita): Regiane Gimenez Mordente, Ana Cláudia da Silva Eira Abreu, Aline di Santo Chaves, Regina Lucia Barbin Matielo. Sentadas (da esquerda para a direita): Ariane Melaré Ramos dos Santos, Fátima Maria Venâncio Porfírio, Lisia Miglioli Galvão, Danielle Aparecida Chaves.

Revista Scientia: O que é a COVID-19?
Dra. Ariane:
A COVID-19 é a doença causada pelo SARS-CoV-2, um vírus da família dos coronavírus. Os coronavírus são vírus existentes há muitos anos, responsáveis por resfriados, síndromes gripais e até quadros respiratórios mais graves, como nos casos dos MERS-CoV e SARS-CoV.

Revista Scientia: Onde surgiu a doença?
Dra. Ariane:
A doença surgiu no final de 2019, com a identificação de casos de pneumonia de causa desconhecida em Wuhan, na província de Hubei, na China. Em pouco tempo, dada a alta infectividade da doença, casos em outros países foram notificados, sendo decretada pandemia em 11 de março de 2020.

Revista Scientia: Como é transmitida?
Dra. Ariane:
A transmissão da Covid-19 acontece de pessoa para pessoa, através de exposição a gotículas liberadas durante a fala, tosse, coriza, espirros etc. A disseminação também pode ocorrer através do contato com superfícies ou objetos contaminados com gotículas de pacientes infectados pelo vírus. Em algumas situações específicas, como durante procedimentos respiratórios, por exemplo, pode ocorrer a aerossolização dos vírus e a transmissão por aerossóis.

Revista Scientia: Quais os sintomas mais comuns?
Dra. Ariane:
Febre, tosse, mialgia, coriza, dispneia, náuseas e vômitos, diarreia e alterações do olfato e do paladar são os sintomas mais comuns. O espectro da doença vai de, desde casos leves semelhantes a um resfriado comum, síndrome gripal, até doença grave, com insuficiência respiratória e necessidade de suporte intensivo.

Revista Scientia: Quando procurar um serviço médico?
Dra. Ariane:
A grande maioria dos casos evolui de forma leve e sem necessidade de medidas adicionais. No entanto, pacientes com comorbidades, extremos de idade, bem como dispneia e febre persistente, devem ser avaliados e acompanhados de modo que possamos diagnosticar precocemente possíveis complicações.

Revista Scientia: Quais os exames usados para confirmação do diagnóstico e qual é a assertividade deles?
Dra. Ariane:
O exame padrão-ouro para diagnóstico é o PCR para SARS-CoV-2 (swab), através de coleta de secreção de naso e orofaringe, preferencialmente. Também são realizados exames de antígenos (utilizados para diagnóstico nos primeiros dias dos sintomas) e sorologias. Em relação às sorologias, elas são utilizadas principalmente para o diagnóstico mais tardio e quando o quadro clínico é muito sugestivo e o resultado do PCR é negativo. É muito importante ressaltar que a assertividade dos exames depende muito do momento em que foi coletado (tempo do início dos sintomas) e da técnica de coleta.

Revista Scientia: Existe um tratamento antiviral específico para a COVID-19?
Dra. Ariane:
Até o momento não há nenhum antiviral específico que tenha demonstrado benefício no controle da mortalidade. Estudos preliminares demonstraram melhora clínica mais precoce em pacientes que usaram o Remdesivir, o que tornou o medicamento um antiviral em estudo e promissor no tratamento para a COVID-19.

Revista Scientia: Cloroquina, Hidroxicloroquina, Ivermectina e Azitromicina são seguras e eficazes?
Dra. Ariane:
Até o momento, nenhuma destas medicações demonstraram efetividade no tratamento para COVID-19, além de terem sido associadas, em alguns casos, a efeitos adversos graves, como arritmias no caso da cloroquina, da hidroxicloroquina e da azitromicina.

Revista Scientia: Quando usar a Dexametasona?
Dra. Ariane:
Dados do estudo Recovery demonstraram diminuição na mortalidade por COVID-19 nos pacientes com quadro moderado/grave que necessitaram de suporte de oxigênio. Além disso, não se recomenda o uso da dexametasona no início da doença, na qual se observa a ativação imune exacerbada.

Revista Scientia: É seguro tomar Ibuprofeno para tratar os sintomas de COVID-19?
Dra. Ariane:
No início da pandemia, estudos associaram o uso de Anti-inflamatórios Não Esteroidais (AINE), como o ibuprofeno, com pior prognóstico da doença. Investigações recentes, com mais pacientes e estudos com metodologia diferenciada não confirmaram a teoria. Neste momento, recomenda-se, se possível, evitar o uso de AINE para os pacientes com indicação precisa e específica para o uso ou que já utilizavam devido a outros motivos, não tem contraindicações para mantê-lo.

Revista Scientia: Após o diagnóstico, quanto tempo o profissional de saúde deve ficar afastado das atividades?
Dra. Ariane:
Conforme a última recomendação da ANVISA, deve-se manter o profissional da saúde em isolamento por 10 dias após o início dos sintomas, caso ele esteja há pelo menos 24 horas afebril e com melhora clínica e não seja imunodeprimido grave. Nos casos graves, com necessidade de UTI, deve-se manter o isolamento por 20 dias após o início dos sintomas, e com retomada há menos de 24 horas afebril e com melhora clínica.

Revista Scientia: Quando um paciente com diagnóstico de COVID-19 deixa o isolamento e passa a ser manejado com as precauções-padrão?
Dra. Ariane:
As recomendações de retirada do isolamento seguem as mesmas recomendações já descritas.

Revista Scientia: Quais são os cuidados a serem tomados quando temos um caso confirmado na família?
Dra. Ariane:
Deve-se manter isolamento domiciliar, se possível com afastamento físico das demais pessoas residentes no domicílio. Caso seja necessário prestar atendimento à pessoa doente ou convívio no mesmo ambiente, manter distanciamento de 2 metros, utilizar máscaras, utilizar a etiqueta respiratória e intensificar a higiene das mãos, que pode ser realizada com água e sabão ou álcool em gel. Além disso, materiais como pratos, copos, talheres, toalhas não devem ser divididos e reutilizá-los apenas após higienização efetiva.

Revista Scientia: O que podemos dizer sobre a vacina contra o novo coronavírus? É possível falar em prazos?
Dra. Ariane:
As vacinas encontram-se em fase avançada de estudo, mas ainda não é possível prever prazos. Vale lembrar que, como todo programa de imunização, quando prontas para distribuição para população, serão primeiramente oferecidas para os grupos de prestadores de serviços essenciais, seguindo exemplo de outras campanhas vacinais, em seguida deverão contemplar os grupos de risco e depois contemplarão a população em geral. É muito importante também considerar que a população infantil ainda não está sendo estudada.

Revista Scientia: Quais são as dicas gerais de prevenção contra o novo coronavírus?
Dra. Ariane:
Como ainda não dispomos de tratamento ou vacina efetiva até o momento, a melhor conduta é a prevenção:
• Evitar aglomerações e praticar o distanciamento social;
• Evitar ambientes pouco arejados ou com circulação artificial de ar;
• Realizar isolamento domiciliar;
• Utilizar máscara e incentivar todos a usarem máscara também;
• Se atentar para higiene das mãos, rotineiramente, antes e após tocar as máscaras ou quaisquer outras superfícies.

Revista Scientia: Quero mais informações sobre a doença e seu tratamento. Onde posso encontrá-las?
Dra. Ariane:
Num momento, no qual as fake news estão disseminadas, sempre procurar se informar em fontes oficiais e confiáveis. Sites como os da Organização Mundial da Saúde e do Centers for Disease Control and Prevention e do Ministério da Saúde. Se você é colaborador do Sepaco, as informações atualizadas também podem ser encontradas na Intranet: “Coronavírus: o que você precisa saber”.

Sobre o autor

  • - Graduada em Fisioterapia pela UMESP - Universidade Metodista de São Paulo
    - Residência em Cardiorrespiratória pelo IDPC - Instituto Dante Pazzenesse de Cardiologia
    - Mestre e Doutora em Ciências da Saúde pela FMABC - Faculdade de Medicina do ABC