Tontura e vertigem em adultos desafio diagnóstico
Dr. Augusto Bragança Reis Rosa
Coordenador Médico da Equipe de
Neurologia do Hospital Sepaco
Introdução
Tontura e vertigem estão listadas como
parte dos sintomas mais comuns em
medicina, afetando cerca de 15-35%
da população geral ao longo de suas
vidas. Juntas, representam cerca de 4%
das visitas em pronto atendimentos
e cerca de 20% das consultas neurológicas
de urgência. A maioria das causas
são consideradas de baixo risco,
porém cerca de 25% dos pacientes
com tontura e vertigem de instalação
aguda possuem causas potencialmente
graves, incluindo acidente vascular
cerebral (AVC) em cerca de 4-15%
dos casos, principalmente se sem
precedentes. Cerca de 10% dos AVCs
com tai sintomas permanecem sem
diagnóstico mesmo após avaliados
em pronto atendimento. Dessa forma,
a correta identificação da etiologia da
tontura e vertigem é de suma importância,
dada a necessidade de direcionamento
de tratamento. A figura 1 lista as principais
etiologias associadas a tontura e vertigem
de início agudo.

Figura 1: Etiologias associadas a tontura e vertigem aguda e sua frequência de ocorrência
Quando o quadro de tontura e vertigem
é recorrente, seja posicional ou espontâneo,
geralmente se associam a quadros
de menor gravidade (apesar de terem
funcionalidade impactada), como VPPB,
doença de Ménière e migrânea vestibular.
Os quadros crônicos associam-se
comumente a doenças neurodegenerativas
adquiridas ou hereditárias do
cerebelo e suas vias, polineuropatias
e vestibulopatias crônicas, como
as associadas ao diabetes mellitus,
além de deficiências vitamínicas
(como hipovitaminose B12)
e doenças infecciosas (como HIV e sífilis).
Avaliação
Existem várias estratégias de avaliação
de tontura e vertigem em nível de pronto
atendimento. Elas se fizeram necessárias,
dada a variedade de causas associadas
aos sintomas e a frequência da dificuldade
de definição diagnóstica. O atendimento
sistematizado também guia a
modalidade de investigação
complementar e o tratamento
pertinente.
A avaliação óculo-motora costuma
ser resumida no acrônimo HINtS
(Head impulse test, nystagmus and
Skew deviation), sendo a avaliação
individualizada de cada parte dos
testes necessária para definição
de etiologia central e, portanto,
essenciais em todo atendimento.
Na avaliação clínica, necessita-se
determinar o curso clínico quanto
à instalação, aos fatores precipitantes,
à duração dos sintomas e aos sintomas
que acompanham a queixa. Sinais
vitais (pressão arterial, frequência
cardíaca, saturação de oxigênio
e temperatura) devem ser registrados
em todos os pacientes com
apresentação aguda.
Os quadros de instalação súbita ou
aguda (sintomas em seu ápice em
segundos) tendem a ser relacionados
a causas centrais, principalmente se
de origem espontânea, ou seja, não
precipitados por posição da cabeça
ou adoção da postura ortostática.
A duração persistente dos sintomas
fala a favor de causas centrais,
principalmente se acompanhados
de diplopia binocular, disfagia, disartria
ou incoordenação de marcha e/ou
apendicular (4Ds do inglês: dizzinnes,
diplopia, dysphagia e dysarthria).
Alteração auditiva unilateral não
distingue entre causas centrais e
periféricas, uma vez que pode estar
presente em AVCs acometendo
a artéria cerebelar inferior anterior,
por comprometimento da artéria
labiríntica, bem como em ataques
de doença de Ménière. Pacientes
com escore ABCD2 maior ou igual
a cinco são de alto risco para ocorrência
de AVC, sendo fator que pode pesar
para investigação de causa central
(escala ABCD2 descrita na tabela 2).
Ademais, o exame neurológico se faz
muito necessário na avaliação da
queixa, com ênfase na avaliação
vestíbulo-ocular, conforme a seguir
descrito.
A intrínseca comunicação da movimentação
dos olhos em relação à cabeça se deve
a amplas comunicações entre cerebelo
(principalmente em suas porções
vermianas e nódulo-floculares),
tronco encefálico e canais semicirculares
pertencentes ao complexo vestíbulo-coclear.
Qualquer disfunção nesses três pilares
pode gerar tontura ou vertigem.
Alguns parâmetros são utilizados para
determinação entre causas centrais
(cerebelo e tronco encefálico)
e periféricas (complexo vestíbulococlear),
usualmente pelo exame físico neurológico.
São definidos da seguinte forma:
Head impulse test – Descrição: o examinador
solicita que o paciente fixe o olhar no centro
da face do examinador. É feito um movimento
rápido (em cerca de 15graus) para as laterais,
um lado de cada vez, observando-se a capacidade
de manter a fixação do olhar – se o olhar
permanecer fixado, indica preservação
do reflexo vestíbulo-ocular (VOR);
caso haja perda da fixação, com sácade
ocular corretiva, existe comprometimento
naquele lado, indicando comprometimento
vestibular ipsilateral.
Presença e características de Nistagmos – Descrição:
Nistagmos são movimentos oculares
rápidos, repetitivos, constituídos de
duas fases – uma lenta, que é patológica
e representa o desvio desproporcional
ocular, e uma rápida, que é a manobra
corretiva. Podem ocorrer de forma
espontânea (no olhar fixo para frente)
ou serem evocados por alguma posição
do olhar (p. ex: mirada lateral para
direita). Nistagmos de direção horizontal,
que mantêm a posição de fase rápida
independente da mirada e amenizam
com olhar para o vestíbulo íntegro,
falam a favor de distúrbios periféricos.
Nistagmos dedireção vertical são
sempre considerados patológicos
ou de causa central. Nistagmos com
mudança de posição conforme a
mirada, com componentes variáveis
ou presença no olhar espontâneo
com VOR preservado bilateralmente,
apontam para causa central.
Teste de desvio skew – Descrição: o paralelismo
ocular é mantido pelo equilíbrio do sistema
vestíbulo-cerebelar bilateralmente. Lesões
centrais podem fazer desvio do olho
(chamados hipertropia quando em
direção cefálica, hipotropia em direção
caudal, exotropia em direção lateral
e esotropia em direção medial), mas
quando presentes no eixo vertical alternando
oclusão dos olhos – um de cada vez – aponta
fortemente para causas centrais (chamado
de desvio skew). A presença do desvio
skew tem especificidade de 95%, mas
tem baixa sensibilidade
(aproximadamente 40%).
A avaliação óculo-motora costuma ser
resumida no acrônimo HINtS (Head
impulse test, nystagmus and Skew
deviation), sendo a avaliação
individualizada de cada parte
dos testes necessária para definição
de etiologia central e, portanto,
essenciais em todo atendimento.
Presença de disartria, dismetria em testes
índex-nariz, índex-índex, calcanhar-joelho,
disdiadococinesia (incapacidade de alterar
movimentos rápidos), alteração de marcha
como alargamento da base e instabilidade
sem lateralidade ou até mesmo incapacidade
de permanecer de pé devem ser
considerados como de causa central.
Todo paciente com causa central suspeita
necessita realização de neuroimagem.
A esses pacientes deve ser oferecida
internação, caso em contexto de
pronto atendimento, para investigação
e manejo, conforme figura 2.

Figura 2: Escore ABCD
Risco de apresentar um episódio de AVCi de
acordo com o resultado do Escore ABCD:
- 0-3 = baixo risco;
- 6-7 = alto risco
- 4-5 = moderado risco;
Exames complementares:
Tomografia computadorizada de crânio –
Exame de rápida obtenção e ampla
disponibilidade, costuma ser o primeiro
exame realizado em causas centrais
suspeitas. Tem baixa sensibilidade – ou
seja, um exame anormal não exclui
causas centrais, mas é de utilidade
para excluir hemorragias intracranianas
e permitir indicação de tratamento trombolítico
com alteplase nos pacientes com AVC
isquêmico suspeito. Angiotomografia
cervical e intracraniana de vasos
arteriais – Exame de rápida realização,
com limitação de realização em idosos
e com função renal limítrofe e desconhecida.
Ajuda na tomada de decisão ao poder
identificar dissecções arteriais ou oclusões
arteriais em contexto de causas centrais.
RM de encéfalo – Embora de menor disponibilidade,
é o exame de eleição para definição de lesões
pequenas em fossa posterior (de até 1cm de
diâmetro). Expande diferencial além de doenças
neoplásicas e vasculares, podendo investigar
também doenças inflamatórias e desmielinizantes
do SNC.

Vertigem em adultos (Banco de Imagens – Adobe Stock)
Exames laboratoriais e ECG – Indicados
para avaliação de causas infecciosas,
metabólicas, cardíacas e intoxicações/medicamentosas.
Nos casos em que é descartada causa
central, oferece-se tratamento com
hidratação venosa, administração de
um anti-histamínico, dentre eles:
betaistina, cinarizina, dimenidrinato,
meclizina e prometazina. Como segunda
opção, utiliza-se lorazepam ou diazepam.
Nos casos refratários, sugere-se
internação para compensação clínica
e investigação de causas centrais. Quando
pertinente, referenciar ao otorrinolaringologista
para realização de manobras de readequação
vestibular
Referências bibliográficas
- Neuhauser HK. The epidemiology of
dizziness and vertigo. Handb Clin
Neurol, 2016. Vol 137 - Zwergal A, Dieterich M. Vertigo and
dizziness in the emergency room.
Curr Opin Neurol, 2019. 32:000-000 - Zwergal A, Feil K, Schneipp R, Strupp M.
Cerebellar dizziness and vertigo: etiologies,
diagnostic assessment, and treatment.
Seminars in Neurology, 2019. - Welgampola MS, Young AS, Pogson JM,
Bradshaw AP, Halmagyi GM. Dizziness
demystified. Pract Neurol,
- 0:1-11.
- Hunter BR, Wang AZ, Bucca AW et al.
Efficacy of benzodiazepines or
antihistamines for patients with acute
vertigo. JAMA Neurol, 2022. 79:846-855.