Efeitos da pressão positiva nas vias aéreas no edema agudo de pulmão cardiogênico

Tempo de leitura: 16 minutos

Fabrício de oliveira
Fisioterapeuta da Unidade
de Terapia Intensiva Adulto
do Hospital Sepaco

Ana Paula Pereira da Silva Jesus
Fisioterapeuta Líder da Unidade
de Terapia Intensiva Adulto
do Hospital Sepaco

Cristiane Almeida Leite
Coordenadora do Serviço
de Fisioterapia do Hospital Sepaco

Graziani França Bernardelli
Coordenadora do Serviço de
Fisioterapia do Hospital Sepaco

Resumo:
A insuficiência cardíaca é a via
final de muitas doenças
cardiovasculares e até hoje
apresenta alta taxa de mortalidade.
No manejo do tratamento do
paciente com IC descompensada,
a ventilação mecânica não invasiva
é um dos principais meios de
tratamento. A congestão pulmonar
está presente no paciente com IC
descompensada, provocando
assim um extravasamento de
líquidos dos vasos para o
parênquima pulmonar e,
consequentemente, interalveolar.

Objetivo: Revisão bibliográfica
sobre os principais desfechos
da VMNI na IC descompensada
durante o manejo do paciente
intra-hospitalar.

Métodos: Revisão bibliográfica
das bases de dados SCIELO,
PUBLIC MEDLINE, PEDdro e
Google Acadêmico.

Resultados: 10 artigos sobre o
efeito da VMNI na IC. A VMNI é
significativa para auxiliar o
tratamento da IC descompensada,
trazendo diversos benefícios,
destacando principalmente a
diminuição do tempo de internação,
taxa de mortalidade, taxa de
intubação orotraqueal por
falência ventilatória e piora
do quadro de congestão,
maior tolerância ao exercício
e melhoras gasométricas.
Ao final, concluímos que
a VMNI no EAPC é segura e
eficaz como um tratamento
não farmacológico e de fácil
aplicação.

Palavras-chave: ventilação mecânica
não invasiva; ventilação com
pressão positiva; BIPAP; insuficiência
cardíaca congestiva; edema agudo
de pulmão cardiogênico.

Introdução
A insuficiência cardíaca (IC) é a via
final de muitas doenças cardiovasculares
(DCV), e até hoje apresenta alta
taxa de mortalidade 1. Dentre
as principais comorbidades da IC
destacam-se as disfunções ventriculares
provocando alterações na frequência
cardíaca (FC), pressão arterial média
(PAM), perfusão periférica e central
e aumento de risco cardiovascular
isquêmico provocando disfunções
múltiplas de órgãos 2.

No manejo do tratamento do
paciente com IC descompensada
dentro da unidade de terapia
intensiva (UTI), a ventilação
mecânica não invasiva (VMNI)
em modalidade CPAP (continuous
positive airway pressure) e BIPAP
(bilevel positive airway pressure)
é um dos principais meios de
tratamento, sendo usada
largamente pelos
profissionais de fisioterapia para
diminuir os sinais e sintomas de
desconforto respiratório e,
consequentemente, reverter o
quadro de congestão pulmonar 3,
visto que a conduta é de fácil
aplicação e não necessita de
sedações e drogas vasoativas,
assim como na ventilação
invasiva.

A congestão pulmonar está presente
no paciente com IC descompensada
devido às mudanças nas pressões
transmurais das paredes dos vasos,
provocando assim um extravasamento
de líquidos dos vasos para o parênquima
pulmonar e, consequentemente,
interalveolar 4. Associado a modificação
transmural, as alterações de pré e pós
carga ventricular, que na IC alteram-se
cronicamente, provocam um estado
de baixa capacidade de ejeção
sanguínea pulmonar e sistêmica 5.

A pré-carga, que é definida como
volume diastólico final (VDF),
apresenta dois mecanismos
dependentes, sendo eles o
retorno venoso (RV) e enchimento
dos ventrículos (EV). O gradiente
de RV é determinado pela
diferença de pressão média
de enchimento sistêmica
(PMES) e pressão atrial direita
(PAD); deste modo, quanto maior
a diferença de pressão entre eles,
maior será o RV. Uma vez que
o átrio direito (AD) e a veia cava
(VC) encontram-se dentro do
tórax, aumentos nas pressões
intratorácicas ou nas pressões
pleurais (Ppl), geram elevação
da PAD e, consequentemente,
diminuem o RV 6.

A pós-carga é caracteriza pela
resistência que o ventrículo
esquerdo (VE) precisa vencer
para ejetar o sangue para a
artéria aorta (AAo). Sabe-se
que quando a pressão intratorácica
é aumentada, momento este que
acontece no final da inspiração,
a pressão positiva exercida pelo
tecido pulmonar comprime a massa
cardíaca, ajudando no momento
de contratilidade, diminuindo
assim essa resistência de ejeção
de sangue do VE para a AAo 7.

Assim, o objetivo desta revisão
bibliográfica é realizar uma busca
nos bancos de dados acerca dos
principais desfechos clínicos da
VMNI no manejo do tratamento
da IC descompensada intra-hospitalar.

Métodos
O presente estudo é uma revisão
bibliográfica das bases de dados
SCIELO, Public MedLINE, PEDro e
Google Acadêmico. Foram incluídos
no trabalho artigos de língua
portuguesa e inglesa com determinante
de tempo de 2010 até a atualidade.

Nas plataformas de pesquisas foram
usados os operadores booleanos
“AND” e “OR”, dos seguintes
descritores: “NON-INVASIVE
VENTILATION”, “POSITIVE PRESSURE
VENTILATION”, “BILEVEL POSITIVE
AIRWAY PRESSURE”, “CONGESTIVE
HEART FAILURE” e “ACUTE CARDIOGENIC
PULMONAR EDEMA”

Resultados
Nos resultados, tabelamos 10 artigos
relevantes sobre o tema e de acordo
com a proposta citada acima.
Os mesmos foram tabelados
em dados de autor e ano, métodos,
objetivo, resultados e conclusão.

LEGENDA: E.C.R = Ensaio clínico
randomizado. R.B = Revisão
bibliográfica. R.I = Revisão integrativa.
E.M.P.O = Ensaio multicêntrico
prospectivo observacional. IOT
= Intubação orotraqueal.

A seleção dos artigos foi realizada
entre dezembro de 2022 e fevereiro
de 2023 por (1) revisor independente.
Os artigos foram selecionados
conforme a coerência entre os
títulos, com o objetivo do
respectivo assunto. Após isso,
foram lidos os resumos e os
compatíveis com o objetivo do
estudo foram selecionados para
leitura na integra.

Foram considerados elegíveis neste
estudo os artigos de ensaios clínicos
controlados e randomizados e
revisões bibliográficas com ou
sem revisão sistemática. Foram
considerados inelegíveis os
estudos de caso clínicos, estudos
em animais, menores de 18 anos,
em indivíduos não hospitalizados
e que não apresentavam IC
descompensada.

Nesta pesquisa, encontramos que
a VMNI é significativa para auxiliar
o tratamento da IC descompensada,
trazendo diversos benefícios, destacando
principalmente a diminuição do tempo
de internação, taxa de mortalidade,
taxa de intubação orotraqueal por
falência ventilatória e piora do
quadro de congestão, maior
tolerância ao exercício e melhoras
gasométricas.

Discussão
O recurso de VMNI já é amplamente
discutido e utilizado dentro da UTI
para diversos quadros de insuficiência
respiratória (IRPA), mas sempre há
dúvidas de como e quando
realmente utilizar e qual objetivo
colocar naquele momento, sendo
ele desde reversão de quadro
gasométrico alterado até ajuda
na mecânica ventilatória. No trabalho
de FERRARI 8 observamos que
o mesmo buscou saber qual
seria o melhor parâmetro
ventilatório a ser acoplado
no paciente com EAPC e
observar seus desfechos clínicos.
Ao analisar os dados de resposta,
FERRARI 8 encontrou que não
há diferenças finais em comparação
ao BIPAP ou CPAP para estes
pacientes e a taxa de intubação
orotraqueal, tempo de internação
e mortalidade foram os principais
achados de sua pesquisa, trazendo
assim segurança para a aplicação
de ambas as modalidade para
nossa prática clínica, assim como
em EL-REFAY 9, onde o mesmo
não encontrou diferenças significativas
em ambos os modos ventilatórios,
porém ficou evidente em seu trabalho
que as respostas clínicas dos pacientes
com EAPC foi melhor nos pacientes
que fizeram VMNI ao comparar
com os que se mantiveram no
protocolo de oxigênio terapia
sem a utilização de pressão positiva.

Nas revisões bibliográficas de
STEFANINI 10, FERREIRA 11 e
VIEIRA 12, numa amostra com
mais de três mil e quinhentos
pacientes, a VMNI em ambos
os modos se mostrou eficaz no
tratamento não medicamentoso
do EAPC, revertendo os quadros
de IRpA, taxa de intubação, tempo
de internação e mortalidade.
Além disso, SOUZA 11 realizou
sua amostra clínica em pacientes
após cirurgias cardíacas, observando
que a mecânica ventilatória, a
troca gasosa e atelectasias
pulmonares foram revertidos
com o uso da pressão positiva,
trazendo como principal desfecho
clínico a redução do tempo de
internação hospitalar.

Outras duas revisões bibliográficas
de BRITO 14 e SANTOS 16, numa
amostra de quase dois mil pacientes,
ambos avaliaram o uso da VMNI
no tratamento não farmacológico
do EAPC sendo ambas eficazes
com respostas clínicas de menor
tempo de internação, redução de
taxa de mortalidade e melhora
do quadro clínico em menor
tempo, poOutras duas revisões
bibliográficas de BRITO 14 e
SANTOS 16, numa amostra de
quase dois mil pacientes, ambos
avaliaram o uso da VMNI no
tratamento não farmacológico
do EAPC sendo ambas eficazes
com respostas clínicas de menor
tempo de internação, redução de
taxa de mortalidade e melhora
do quadro clínico em menor tempo,
porém não houve diferença
significativa em qual modalidade
usar em comparação CPAPxBIPAP.
Estas respostas corroboram com
o estudo de ALBERTINI 15, que
em um estudo multicêntrico
observacional com quase mil e
trezentos pacientes analisou que
não há diferenças em desfechos
clínicos ao comparar CPAPxBIPAP.
Porém, ao observar o grupo que
não utilizou a VMNI no tratamento
de EAPC, vemos que a taxa de
tempo de internação, intubação
orotraqueal e alterações gasométricas
foram significativamente superior
no grupo que não utilizou VMNI.

Por fim, no estudo de OLIVEIRA
13 e OLIVEIRA 17, ao observar a
tolerância ao exercício, o grupo
que utilizou a VMNI tornou-se
mais tolerante ao atendimento,
melhora na troca gasosa, na
mecânica pulmonar, na resposta
clínica ao exercício e nos testes
funcionais, corroborando assim
com as demais pesquisas que
a VMNI é segura e eficaz para
o paciente com IC descompensada.

Como dado adicional, e de maneira
mais sintética, conforme as diretrizes
do ISCCM 2020, a VMNI é recomendada
com nível de recomendação 1A para
doentes internados com insuficiência
respiratória aguda por edema pulmonar
cardiogênico; 1B com relação a ambos
os modos CPAP e BIPAP de serem
seguros e eficazes. Cabendo a ressalva
de BIPAP para os doentes com edema
pulmonar cardiogênico e hipercapnia
(recomendação 1A) 18.

Conclusão
Ao analisar todos os artigos e comparar
os dados de respostas, observamos que
é significativamente positivo o uso da
VMNI no tratamento não farmacológico
do EAPC intra-hospitalar; além disso,
observamos também que na bibliografia
estudada não houve diferenciação do
uso entre BIPAPxCPAP para o
atendimento de VMNI no paciente
cardiopata. Ficou comprovado
também, pela análise bibliográfica
dos dados de respostas, que o uso
da pressão positiva melhorou
a tolerância ao exercício, trocas
gasosas e mecânica pulmonar,
diminuiu tempo de internação,
taxa de intubação orotraqueal
e mortalidade.

Ao final, concluímos que a VMNI
no EAPC é segura e eficaz como
um tratamento não farmacológico
e de fácil aplicação.

Deixamos claro que há a necessidade
de mais estudos específicos na área.

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