Apoio à transferência de treinamento

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Cristiana de Farias Bezerra
Da redação da Revista Scientia
Eloá Otrenti
Da redação da Revista Scientia

Não se questiona a importância e a necessidade de
implementação de atividades educativas formais para
profissionais da área da saúde, no entanto, é essencial
considerar a complexidade do desenvolvimento de tais
atividades. Criar treinamentos demanda profissionais
hábeis tanto no conteúdo a ser compartilhado quanto
com experiência e domínio de teorias e estratégias de
ensino de adultos. Outro aspecto importante
é a avaliação desses treinamentos, desde a satisfação
dos participantes até o impacto desses treinamentos
na rotina de trabalho, finalidade precípua de toda ação
educativa para trabalhadores.

A psicologia organizacional é uma das áreas precursoras
no assunto, e que mais se ocupa da avaliação de
treinamentos presenciais ou on-line, oferecendo
aos interessados vasto e consistente arcabouço
teórico e instrumentos validados.

Figura 1 – Pirâmide com 4 níveis na base reação, seguido de aprendizado, comportamento e resultado.

Para avaliar rigorosamente um treinamento, devem ser
implementados sistemas de avaliação, que são um
conjunto de ferramentas que mensuram os resultados
de treinamentos em diversos níveis.

O sistema de avaliação de treinamentos mais tradicional
e utilizado até hoje foi desenvolvido na década de 70,
por Donald Kirkpatrick, que propôs um sistema em
quatro níveis (fig1).

No sentido de encontrar medidas mais completas e
fidedignas de avaliação de treinamentos, um grupo
de pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB)
vem se dedicando a criar modelos desde meados dos
anos 80. Fruto deste trabalho, surgiu o MAIS (Modelo
de avaliação integrado e somativo), de Borges Andrade
(1982), e o IMPACT (Modelo integrado de avaliação
do treinamento no trabalho), de Abbad (1999).

O Modelo MAIS tem cinco componentes (insumos,
procedimentos, processo, resultados e ambiente).
O IMPACT apresenta sete componentes: suporte
organizacional, características do treinamento,
características da clientela, reação, aprendizagem,
suporte à transferência e impacto do treinamento
no trabalho.

Modelos de avaliação de treinamento podem ser
classificados em genéricos ou específicos. Os modelos
genéricos, como o proposto por Kirkpatrick, apenas
descrevem as variáveis que se relacionam ao
treinamento. Já os modelos específicos, buscam
testar as relações entre as variáveis e os resultados
de treinamentos, categoria em que se inserem
o MAIS e o IMPACT.

Abbad (1999) descreve que os resultados encontrados
na avaliação de reação e aprendizagem, conforme
modelo de Kirkpatrick, não se relacionam fortemente
com impacto no trabalho. Ou seja, mesmo que o
participante tenha resultados positivos na etapa de
avaliação de reação e aprendizado, não significa
que o treinamento terá resultado considerável no
comportamento no trabalho.

A mesma autora ainda aponta que não é possível
afirmar um relacionamento direto entre os níveis
de avaliação, mas considera que a reação e aprendizagem
dependem de variáveis como as características
da clientela e o suporte à transferência do conteúdo
aprendido no trabalho.

A transferência de treinamento é um fenômeno
importante para a efetividade dos programas de
treinamento de pessoal nas organizações, pois se
refere à capacidade dos indivíduos em aplicar
habilidades, conhecimentos e atitudes adquiridos
em um contexto de treinamento para situações
práticas no trabalho ou em outros contextos.
Segundo Abbad e Sallorenzo (1999), “Saber e
querer fazer alguma coisa de modo eficaz ou
inovador não são condições suficientes à
transferência positiva de treinamento ou tecnologia.
Há variáveis do ambiente organizacional que
controlam os efeitos do treinamento e de
quaisquer outras formas de instrução, educação
e formação de pessoal”

Diante disso, no IMPACT ganha destaque o
suporte organizacional para que o participante
do treinamento possa implementar na sua rotina
de trabalho o conhecimento adquirido.

Abbad e Sallorenzo (1999) publicaram artigo
que apresenta a construção e validação de
uma medida de suporte à transferência
de treinamento.

As escalas desenvolvidas avaliam tanto o suporte
individual à transferência de treinamento
(considerando fatores como o feedback, a
participação dos funcionários no processo de
treinamento, a motivação dos funcionários para
aplicar o que foi aprendido e a disponibilidade
de recursos para apoiar a transferência de treinamento)
quanto o suporte organizacional (que utiliza fatores
como a cultura organizacional, o suporte da liderança,
a comunicação, o clima de trabalho e a
disponibilidade de recursos).

Os resultados indicaram que as escalas apresentaram
boas propriedades psicométricas e mostraram
que o suporte à transferência individual e
organizacional foi positivamente relacionado
à transferência de treinamento.

Em revisão de literatura, Zzerbini Aabbad (2010)
concluem que uma série de fatores afetam a
transferência de treinamento, incluindo a
relevância do treinamento para o trabalho, a
aplicabilidade das habilidades e conhecimentos
adquiridos no treinamento para o trabalho e
o suporte do ambiente de trabalho.

Portanto, escalas desenvolvidas e validadas são
instrumentos úteis para avaliar o suporte à
transferência de treinamento em organizações
e podem ser usadas para identificar áreas
que precisam ser melhoradas para aumentar
a transferência de treinamento e,
consequentemente, a efetividade dos programas
de treinamento e desenvolvimento de pessoal.

Diante dessas considerações, ganha ainda mais
força a importância de um sistema de avaliação
de treinamentos, para monitoramento em
diversos níveis. É importante que as medidas
avaliativas sejam planejadas e implementadas
conjuntamente com as ações educativas em si.
Vale relembrar que os resultados encontrados
nas avaliações precisam ser analisados criticamente
para retroalimentar os processos educativos
para que estes sejam mais eficazes

Equipe médica em treinamento (Banco de Imagens – Adobe Stock)

Referências bibliográficas

  • Borges-Andrade JE. Avaliação somativa de
    sistemas instrucionais: integração de três
    propostas. Tecnologia Educacional.1982; 11(46):29-39.
  • Castro GA. Um modelo integrado de avaliação
    do impacto do treinamento no trabalho IMPACT.
    [dissertation] Brasília: Instituto de Psicologia,
    Universidade de Brasília; 1999. 262 p.
  • Abbad G, Sallorenzo LH. Desenvolvimento e
    validação de escalas de suporte à transferência
    de treinamento. RAUSP Management Journal.
    2001; 36(2):33-45.
  • Zerbini T, Abbad G. Construção e validação
    de uma escala de transferência de treinamento.
    Psicol. cienc. prof. [Internet]. 2010 [cited 2023
    Apr 10];30(4):684-97. Available from:
    https://www.scielo.br/j/pcp/a/vRY4xNBg6Ykm9s
    dw7GN8xqv/?lang=pthttps://doi.org/
    10.1590/S1414-98932010000400002

Sobre os autores

  • - Enfermeira de Educação Continuada do Hospital Sepaco
    - Especialista em Educação Corporativa pelo Senac
    - Especialista em Docência e Licenciatura pela Universidade Iguaçu
    - Especialista em Gestão Hospitalar pela Universidade São Camilo
    - Designer de cursos online

  • - Enfermeira de educação continuada do Hospital Sepaco
    - Doutora e mestre em Ciências pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo
    - Especialista em Gerência de serviços de Enfermagem pela Universidade Estadual de Londrina
    - Produtora de conteúdo audiovisual e designer instrucional